A figura de Satanás, tal como é amplamente conhecida no cristianismo, não surge de maneira explícita e uniforme nas escrituras judaicas antigas. O “inimigo absoluto de Deus”, o ser maligno que governa o inferno e tenta a humanidade, é resultado de séculos de transformações culturais, adaptações teológicas e reelaborações doutrinárias feitas especialmente pela Igreja. Assim, pode-se entender Satanás não como uma realidade ontológica, mas como um mito teológico, construído historicamente para servir a funções religiosas, sociais e políticas.
No Antigo Testamento, a palavra “satã” significa originalmente “adversário” ou “acusador”, e não se refere a um ser demoníaco independente. Em livros como Jó, “o satã” aparece como membro da corte celestial, um fiscal divino que testa a fidelidade humana sob a permissão de Deus. Só mais tarde, influências persas (zoroastrismo) e helenísticas começam a moldar a ideia de uma entidade oposta a Deus.
Nos evangelhos e nas cartas paulinas, a figura de Satanás ganha contornos mais claros: tentador de Jesus, inimigo da Igreja e símbolo do mal. Essa construção serviu como recurso narrativo para explicar o sofrimento humano, as perseguições contra os cristãos e a luta moral entre fé e pecado